Curating And The Educational Turn – Paul O’Neill & Mick Wilson
Humberto Eco e Rancière abordaram ambos, esta ideia de que a arte não está completa sem um intérprete. Como tal, a participação activa desse mesmo observador, a possibilidade de obra aberta, fez com que todos os conceitos de “arte”, “obra”, “artista”, “público”, “mediador” e “instituição” tivessem que sofrer reestruturações. E sendo que todos somos participantes da obra, então também as questões de “autoria” sofreram alterações e por sua vez, as noções de obra enquanto “trabalho” ou “objecto artístico”. Assim, as obras de arte desenvolveram-se sobre novos modelos de produção e até de apresentação, porque lhes foi dada a possibilidade de participação do público na sua criação e porque cresceram sem essa necessidade de se limitar às condições das respectivas galerias onde seriam apresentadas.
“Developing new models for the production and presentation of such work, however, provides an opportunity for galleries and museums to embrace the ways in which contemporary artists are increasingly operating beyond the studio and gallery and thereby to extend their reach and influence.” [Sally Talent; p. 187]
Com isto, toda a programação das instituições em volta das questões educacionais, também teve que ser remexida. As estratégias anteriormente utilizadas para instruir o público na arte tiveram consequentemente que sofrer alterações para irem de encontro aos novos conceitos que entraram pelas instituições artísticas dentro na era contemporânea. A arte fundiu-se com a pedagogia, no momento em que se cria um espaço para que o público faça as suas interpretações e participe da mesma. Um espaço onde o observador ganha a possibilidade de intervir, criticar, questionar, debater e posicionar-se num lugar onde o seu papel é activo. E toda esta experiência se torna numa aprendizagem que o leva à sua instrução, deixando de se considerar arte, apenas como arte.
Então, para que tudo isto fosse viável, criou-se um “novo institucionalismo”, que propõe uma transformação da instituição de arte a partir de dentro e está caracterizado pelo seu carácter aberto e de diálogo, que faz uso de algumas das estratégias inerentes aos processos de criação de muitos dos artistas contemporâneos. Geraram-se então espaços e modos de apresentação que reflectem esse mesmo conceito.
“What ‘new institutionalism’ demands is an integrated approach to public programming rather than the more traditional and territorial departmentalisation of these areas of work.” [Sally Talent; p. 188]
Toda esta reviravolta, teve um grande impacto em relação à aprendizagem dentro da instituição, porque antes vivíamos perante um público que apenas aceitava o que as instituições artísticas lhe transmitiam sendo que a sua experiência pedagógica era imposta pelos conhecimentos dessas mesmas instituições relativamente às obras expostas, Assim, como não existia uma necessidade de mobilização do público por parte das instituições, estávamos perante um público passivo. Com a possibilidade de obra aberta, todos esses hábitos se reestruturaram e a distanciação do trabalho dos departamentos de educação e de aprendizagem era sem dúvida um ponto chave. Talvez o ponto principal. Porque a “culpa” do nosso público displicente é em grande parte dos departamentos de educação.
“(…) wanting to create an environment, even an ‘aesthetic’, of educational and/or academic engagement, but the overall outcome is often to produce a spectacular event rather than an educational experience. (…)while a participant in an educational programme could expect to be involved in the pedagogical process, the participant in, or audience of, curatorial projects witnesses them not as a site of learning but rather as a spectacle [Sally Talent; p. 190]
Nesta fase é de tamanha importância o trabalho do curador, visto que, o seu trabalho tem vindo a transformar-se num processo educacional e está (também ele) agora a ser confundido entre as palavras “arte” e “pedagogia”. Mas o objectivo, não é a reintegração do curador, enquanto perito, acusado de educar o observador sobre o conteúdo de uma determinada colecção, mas sim, discutir a possibilidade, na era contemporânea, da existência de uma espécie de “curatorialização” da educação, através do qual, o processo educativo se torna, muitas vezes, o próprio objecto da produção curatorial. Fazendo da arte da curadoria uma prática educacional.
Como já disse antes, a obra aberta de Umberto Eco e o Espectador Emancipado de Rancière, trouxeram esta ideia de que a obra não está completa sem um intérprete e como tal, para que se complete, é necessária este co-produção. Um conjunto de Interpretações, discussões, investigações, intervenções e trocas de ideias que alimentam a educação do observador sem que para isso, este, tenha que ser educado de uma forma impositiva. O papel do mediador/curador, não é o de instruir consoante definições, explicações e ideias pré-concebidas. O papel do mediador/curador é o de orientar este espaço que a obra aberta nos fornece, de modo a que todas as cartas sejam postas na mesa e que cada observador consiga instruir-se a si mesmo através de toda esta troca de informação.
“Many of the contributors to this volume begin by problematising these very terms and, indeed, this is indicative of the urgency with which the question of non-instrumentalised, emancipatory and critical cultural practices are approached against a political background increasingly dominated by rhetorics of culture-as-service, knowledge production, the creative economy, immaterial labour and educational outcomes.” [Paul O’Neill & Mick Wilson; p.14]
Resumindo: o grande objectivo deste “novo institucionalismo” não é o de gerar um público com um pensamento convergente, mas sim, o de obter resultados no público. Resultados de uma introspecção gerada por todas as possibilidades deixadas pela obra aberta, ou seja, educar através do percurso de cada um, das aprendizagens de cada um, das intervenções de cada um e fazer de cada um, co-autor da sua própria educação – em interacção, vamos levantando as nossas dúvidas, falando sobre as nossas certezas, construindo conhecimento. Tudo isto gera uma educação através de processos dinâmicos e não através de condições fixas ou de processos educacionais já assentes.
Recensão Crítica do Texto
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