Do mundo

Pedro e Inês – António Ferreira

Entre a doçura das palavras de dor de Pedro, somos convidados a assistir a uma história de amor. Que como todas, não acaba bem. Pedro encontra-se mergulhado no seu sofrimento, como se de si, apenas o corpo restasse. O corpo e as memórias, que nele perduram. Este filme é-nos apresentado em três tempos, porque na verdade os desgostos de amor são de todas as épocas. De qualquer um. E esse é o propósito desta ideia. Mostrar o quão actual e futura é esta história de amor. Somos emaranhados nas palavras de Rosa Lobato Faria, adaptadas agora ao grande ecrã, desde o segundo em que Pedro abre os olhos e a história começa. Com ele surgem sentenças como “Não tenho família. Matei-os a todos. No coração. No pensamento e na memória”. E aqui levamos o primeiro murro no estômago. O sofrimento tira-nos tudo, até os que ficam. Os enquadramentos inesperados da realização, por vezes demasiado próximos ou até desfocados, também nos envolvem nas palavras de Pedro. Nos sentimentos de Pedro. Do mais puro e nobre ao mais repudiante e medonho. E nesta escrita tão leve ou tão dura quanto o que se sente continuamos com desejo em saber o que lhe vai no peito. Em saber mais sobre esta dor que lhe corre nas veias. Ou as memórias que lhe correm nos dedos. Esta produção, não nos deixa ser indiferentes ao discurso tão perdido e tão sereno de Pedro. Como se o amor lhe trouxesse lucidez. Mas não seria de esperar o contrário? Sente-se essa contrariedade até nas cores escolhidas pela realização. As escuras e sombrias que nos fazem sentir o medo, a solidão e a profunda dor da sua personagem, e a mais vivas e quentes e que nos levam ao engano e num segundo acreditamos que talvez, e só talvez, esta história ainda tenha um final feliz. Quando de Pedro nos chega um: ”Somos unos. Infinitos. Eternos. Atados pela paixão. Pelo desespero. Pela loucura. Pela vontade da carne.” E depois um… “deixei que te matassem, era essa a principal razão da minha fúria.”, levamos o segundo e terceiro murros no estômago. Num misto de pormenores, junta-se a perda do norte com a vontade de reviver. Outra e outra vez. Somos embalados por um amor avassalador, que nos derruba com um simples “dei razão ao povo que me chamou demente. Restas-me tu. Resta-me amar-te. Virá uma noite em que seremos um. E fomos. Fomos todos e tudo. Pedro e Inês. Quando me vires dormindo, sufoca-me, mata-me e salva-me.” E o mundo cai aos nossos pés, de rompante. Este filme, é gigante. Mas amar também. Não poderíamos fazer um filme português, enraizado numa história tão bonita de amor, se o mesmo não fosse à sua altura. A sonoplastia intensifica, cada fala, cada silêncio, cada desejo, cada alucinação e num sopro, leva-nos de rompante para dentro de um só coração. O de Pedro. O de Inês. Na verdade, são apenas um.
Crítica Artística
Em Cima Da Hora – Instagram

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