Do mundo

“Isso é Psicológico”

Pensei algumas vezes antes de escrever este texto. Primeiro porque acredito que o que me foi dito, de todas as vezes, não tenha sido com intenção de me mandar para de onde vim. Mas também, porque respeito a profissão. Independentemente de todas as suas falhas. Porque já a vi salvar vidas. Porque tinha uma enorme na família. E porque conheço muitos outros entre amigos.

Nos últimos dois anos corri mais de 7 médicos à procura de respostas. Sabia que os sintomas não eram da minha cabeça. Sabia que alguém me havia de ouvir. Mas voltei sempre para casa com as respostas que não queria. O “ah isso é psicológico” foi a mais comum. (como se eu não soubesse de todo o que é “ser psicológico”, enfim). Mas também trouxe muitos “eu não vejo nada aí”, “tem de facto algo, mas não é nada disso”, “tem aqui uns comprimidos e depois logo vemos como fica”, “volte daqui a um mês se ainda tiver a sentir dores, aí vemos melhor”.

As respostas eram, maioritariamente, um “minha querida, isso não é nada. Volte lá para o seu cantinho”

E as consultas iam de 5 a 20 min.

5 a 20 min é o que se considera suficiente para diagnosticar um “coisa nenhuma”, isso ou para nos levarem, quase como um tropeço na sala errada, uns bons 30€.

Também vivi a versão contrária. Como se o mundo estivesse a cair. Sugestões do outro mundo e curas de todas as vertentes. Era lasers, cirurgias, intervenções noutros países, sabe-se lá.

Ora, para quem procura respostas, a vinda para casa era sempre pior do que a chegada ao médico. Vais com 2 perguntas, voltas com mais 5.

Algures em dois anos de um livro cheio delas, decidi afastar-me da medicina e procurar outras opções.

E em primeiro, veio a Fisioterapia. Primeiro porque é outro grande leque de amigos que guardo no bolso. Segundo porque, nunca me mandou embora sem resposta.

A fisioterapia surge e de repente eu sinto-me novamente com voz. Primeiro porque me deixam sentar mais do que 5 minutos e segundo porque me ouvem de facto. E mexem com a dor. Como se de facto fôssemos duas.

No entretanto, surge outro contratempo e eu levei-o também para esta sala. Ainda tentei recorrer à medicina mas das três tentativas voltei com mais problemas do que aqueles com que tinha ido. Por isso parei.

De chorar. De não saber. De não conseguir.

E voltei à mesma sala. A Fisioterapia tem muitas casas. E muitos gabinetes. Mas também tem muito de humano e de verdade. E a verdade é que a recuperação custa, mas está mais perto. Do que aos olhos de outros. Sem grandes malabarismos.

E as dores vão diminuindo. E vamos deixando de ser duas. A ser uma e meia. E futuramente eu, novamente.

Escrevo este texto quase em desespero. Não que o sinta efectivamente. Mas porque bati em muitas portas e acho triste, quer no público, quer no privado, que o tratamento seja o mesmo. Que a insensibilidade seja maior que a sala. Que os olhos nem saibam quem sou. Mas mais que isso, que não possa confiar neste serviço. Que é tão nosso. E está tão pobre.

Acredito e vejo que continua a salvar vidas. Mas também acredito e vejo que continua a perder muitas. Vidas. Almas. Pessoas.

E as pessoas são o que faz este mundo girar. A diferença deste, para outros, é mesmo isso. A humanização. E o quão humanos somos.

Quero, com isto, não ser ingrata com a medicina que em muito já nos ajudou. Mas também quero, com isto, fazer mais por quem me está a acompanhar.

Os que não escolheram a medicina, mas a quem esta escolheu abraçar. De coração.

E nos devolvem a respiração. Que há muito estava contida no medo de nunca recuperar.

 

Leave a Reply

O seu endereço de email não será publicado.